terça-feira, 10 de julho de 2012

Das coisas que aprendi com o Ubaldo...


Quando abri a porta ele me olhava, com um olhar ao mesmo tempo curioso e assustado, rosnando para defender o território que agora entendera como dele... Sem saber o que fazer, sorri e continuei parada na porta, com um pouco de medo de ser mordida por ele e ao mesmo tempo encantada com aquele bichinho abusado que mal chegara e já me impedia de entrar na minha própria casa...
Foi uma questão de segundos, mas me lembro hoje como se tivesse durado horas: o momento em que o vi pela primeira vez, já o considerava o cachorro mais abusado e encantador do mundo!
Meu irmão, que encontrava-se sentado no sofá, me falou para entrar e tratou de me apresentar ao Ubaldo, nosso novo companheiro. Tentei fazer um carinho e ele rosnou. Fiz a fria e fui pro meu quarto: mas ele já ocupava meu coração assim mesmo, sem pedir permissão pra entrar.
O convívio em casa foi melhorando depois de sua chegada, nos tornamos uma família de novo, depois de anos convivendo trocando farpas. O Ubaldo nos trouxe de volta o amor, a alegria e a paz que faltavam em nossa casa. O apartamento de dois quartos parecia pequeno pra ele - e o era, de fato! - mas ele fazia tudo parecer maior. Latia como gente grande, sempre no horário da novela ou sempre quando algum vizinho abria a porta... ou ainda quando queria dar uma voltinha lá embaixo. O apartamento não era o local adequado pra um cachorro daquele porte, mas ele transformara nossas vidas ali dentro. Quando tentávamos fazer um carinho, ele deitava, rolava, se entregava e logo depois avançava  de leve na nossa mão, como quem dissesse: "Eu te amo, mas não vou deixar você me machucar!". Completamente compreensível, depois de tudo o que ele sofreu nas ruas...
Quando ele ficou doente, descobri que eu poderia ser uma boa mãe... foi no momento em que meu irmão se mudou e eu me vi sozinha com ele, cuidando da minha faculdade, do meu trabalho, da doença dele e da casa. A vida estava uma bagunça, mas eu era mais feliz ao seu lado, porque sempre que eu chegava em casa, ele me recebia aos pulos, latindo e me recepcionando com alegria. Não me iludo, sei que o que ele queria era descer pra fazer xixi ou cocô, depois de ficar o dia inteiro preso em casa. Mas ainda assim, ele o fazia e voltava correndo, porque sabia que aquele era o seu pequeno castelo e que era muito amado ali...
Quando íamos ao veterinário, ele sempre encarava os cachorros da rua que vinham pra cima de nós, abusados como todo cachorro de rua e como o próprio Ubaldo o era... mas quando as sessões de quimioterapia começaram a fazer efeito, ele já não se sentia forte o suficiente para subir a ladeira do Loreto e eu o fazia com ele no colo, e ele não rosnava mais pra mim, porque sabia que aquilo era para o seu bem... quando eu passava com ele no colo, os cachorros da rua já não avançavam mais em mim, meio que se solidarizando com o Ubaldinho... Mas a Cris nos ajudou e ele voltou a ser aquele cachorro forte e abusado que eu conheci.
Até que finalmente conseguimos leva-lo para morar em Teresópolis, em um jardim onde ele poderia correr a vontade e fazer suas necessidades fisiológicas quando sentisse vontade.
Foi uma troca injusta pra mim, mas muito feliz pra ele e isso era o que importava pra mim: faze-lo  feliz!
Mesmo em Terê, o Ubaldo ainda era o cachorro desconfiado e abusado de sempre (veja no vídeo como ele tratou o Bud logo no primeiro dia, rs), mas que nos devotava um amor incondicional. Com o Bud, era um mala. Com o Ozzy, um amigo implicante. Mas tenho certeza de que ambos o amavam como nós...
E quando o Ozzy se foi, acredito que ele tenha sido um bom parceiro ao Bud e aos meus pais e serei eternamente grata por isso.
O Ubaldo foi um dos cães mais inteligentes que eu já conheci. Nos entendia e nos respondia como se fosse gente. Ou ainda melhor, já que gente é egoísta e ele só trazia alegria. Me lembro quando ainda morávamos no apartamento, que eu estava brigando com um namorado e ele tomou as minhas dores, me olhando com solidariedade e dando a patinha ao dito cujo como quem diz: "Pare de fazer minha irmã sofrer!".
Ubaldo e sua patinha, sempre levantada para quem te fizesse um  carinho ou demonstrasse um pouquinho de afeto... Alguns diziam que ele era feio, mas feio era os olhos de quem dizia isso. Ubaldo era lindo! Bastava olhar nos seus olhos pra ver o quão bonito ele era: sua beleza estava lá, no fundo dos seus olhos, nas suas atitudes e no seu coração. Todos os cachorros são exemplos para nós, humanos. Temos muito o que aprender com eles.
Quando fui me despedir dele, antes de vir pra cá, eu não imaginava que aquela seria a última vez que eu o veria. Tentei abraça-lo, ele rosnou, mostrou os dentinhos quebrados e eu dizia: "Pára que eu não sou dentista!" Mas claro que ele não parava... será que ele sabia que aquele seria nosso último encontro?
Ubaldo, eu te peço perdão por não ter estado com você nos seus últimos 5 meses de vida... mas sei que você foi feliz e que o Lian e meus pais fizeram tudo o que podiam por você.  Se é verdade o que o veterinário disse, que você queria morrer, então acredito que agora esteja em paz.
Ao lado do Ozzy, do Argos e do Elfye, o paraíso ganhou mais um anjo ontem. Nossos corações estão despedaçados, mas vocês nos ensinam a não sermos egoístas, portanto seguiremos nossas vidas: faltando um pedaço, mas tentando não sofrer. Você foi feliz em nossa casa, acredito nisso, e nos ensinou muito mais do que gratidão.
Você mudou a nossa forma de amar e nos tornou melhores! Cada pessoa da nossa família tem muitas histórias bonitas ao seu lado e todos nós devemos muito a você!
Essa foto é do nosso último encontro e essa saudade que eu já sentia, agora irá morrer comigo...

Fique em paz... nós amamos você!